Memória, linguagem e mente - A emergência da realidade entre a psicanálise e as neurociências
Por Eduardo Ledo
"... Devemos talvez aos gramatas de Port-Royal e a Wilhelm von Humboldt o pioneirismo de haver explicitado o papel da língua como instrumental do pensamento e da cultura. A partir de então, a linguagem tornou-se onipresente na linguística (por suposto), na filosofia e nas ciências humanas alargadas, mas permaneceu praticamente eludida na neurobiologia dos séculos XIX ao XXI, ainda fixada no modelo analógico-localizacionista, quando não no dualismo mente-corpo. Sigmund Freud se encontrou nos dois lados da fronteira e foi responsável por "entradas e bandeiras" de investigações recíprocas. Talvez a sua grandeza e originalidade resida no fato de que, tanto quanto nas trincheiras da neurobiologia quanto nas da psicanálise propriamente dita, nunca se ofuscou em relação à importância das palavras, bem como aos seus limites.
... Quando o pós-freudismo se afastou do universo linguageiro, após a deriva anglo-saxã da psicologia do ego que, distanciando-se da função da palavra, propunha uma psicanálise adaptativa e conformista aos preceitos do capitalismo, Jaques Lacan propôs um retorno a Freud e à função e ao campo do discurso e da linguagem em psicanálise (LACAN, 1966, p. 237-322). Passados mais de cem anos, a psicanálise guarda a sua afinidade pela palavra como instrumento de desvelamento do universo simbólico, bem como dos seus limites no real.
Mas essa é uma outra história..."